Por que PESSOAS COMUNS e “de bem” são capazes de atos de extrema crueldade contra inocentes?
Até onde podemos ir?
Há situações em que a insegurança, a ignorância e a busca por reconhecimento e valorização tolhem a capacidade de distinção entre o certo e o errado, sufocando valores morais a ponto de pessoas comuns se tornarem capazes de infligir grande sofrimento a alguém que identificam como diferente de si.
MARIA MAURA FADEL é psicanalista, mestre em psicologia clínica.
Importante: não se trata de agir descontroladamente em um momento de raiva, mas sim de aceitar calmamente uma determinação – mesmo que a ação cause grande mal a alguém. Dependendo do contexto, as pessoas podem simplesmente ser levadas a crer que não devem exprimir sua vontade, tomando opiniões alheias como suas próprias “verdades”.
Situação igualmente assustadora foi o assassinato de 38 mil pessoas (e a prisão de outras 35 mil, enviadas para campos de concentração) durante a Segunda Guerra Mundial pelo batalhão de reserva 101. Que crueldades (incluindo mortes) tenham sido cometidas por soldados e oficiais do exército é revoltante, mas até certo ponto “comprensível”. Mas o que chama a atenção é que essa formação era composta por civis, todos com mais de 35 anos – até então pais de família “de bem” –, sem nenhum treinamento militar, recrutados na cidade de Hamburgo. O mais desconcertante é que nenhum deles era realmente obrigado a cometer as terríveis ações e os que eventualmente se recusavam a participar não sofriam represálias. Na verdade, esses crimes contra a humanidade não foram praticados sob coação, mas por outros motivos. Creio que um dos principais seja o desejo desesperado (e talvez insuspeito até então até para eles mesmos) de agradar os outros membros do grupo e, assim, serem aceitos. E, claro, havia o prazer partilhado de se sentir poderoso e superior às vítimas.

Em Psicologia de grupo e a análise do ego, de 1921, Sigmund Freud afirma que a crueldade e a intolerância para com os que não pertencem aos mesmos núcleos tendem a ser consideradas “naturais” em diferentes culturas. É a conhecida fórmula do “nós” (aqui) contra “os outros” (de preferência lá). Nesse processo, o outro não é reconhecido como um semelhante e sim como um ser inferior, que não merece a consideração que teríamos por um igual e pode ser encarado como uma ameaça a ser eliminada. No mesmo artigo, citando o psicólogo Gustave Le Bon (1841-1931) e concordando com ele, o criador da psicanálise lembra que, quando as pessoas se reúnem em grupo, inibições individuais tendem a ser refreadas e atitudes cruéis, brutais e destrutivas que estavam latentes “como relíquias de uma época primitiva” são despertadas, fazendo com que a conduta ética caia muito abaixo daquela que se teria individualmente.
Identificação
McDougall ressalta que quanto maior for a “fluência psíquica”, essa espécie de “homogeneidade mental”, mais facilmente será constituído o grupo e mais intensas serão suas manifestações. O resultado mais notável e também o mais importante da formação é a exaltação ou intensificação da emoção de cada integrante.
Aliada a isso, a necessidade de agradar, de sentir-se aceito, pode amortecer certas crenças e padrões de comportamentos que, se a pessoa estivesse sozinha, dificilmente questionaria. Mas a identificação – entendida por Freud “como a mais remota expressão de um laço emocional com outra pessoa” – faz com que, em algumas circunstâncias, nos misturemos perigosamente. Inegavelmente a identificação é um processo fundamental na constituição psíquica do sujeito. A criança tem nas figuras parentais seus modelos e as toma como ideal. Mais tarde, na vida adulta, a identificação (que funciona como um laço entre os integrantes de um grupo) tende a se repetir, geralmente de maneira inconsciente (e, neste momento, não mais de forma constitutiva) em relação a pessoas que encontramos ao longo da vida.
….Tudo isso faz pensar que a ânsia por ser acolhido, valorizado e reconhecido pode tolher nossa capacidade de questionar e escolher o que de fato acreditamos ser certo ou errado, colocando em xeque valores éticos e morais. E nos tornando, embora adultos, tal qual crianças que pouco se importam com o desconforto alheio, desde que seus desejos e necessidades imediatos sejam atendidos – como se não existissem consequências.

Estar atento pode ajudar muito
Mas vale lembrar que, sob a influência da sugestão, os grupos também são capazes de realizações nobres, abnegação, desprendimento e devoção a ideais elevados, enriquecendo a capacidade individual de motivação. E, em muitos casos, é possível afirmar que uma pessoa pode ter seus padrões morais elevados pelo grupo. Por via das dúvidas, convém manter olhar crítico em relação às opiniões, decisões e veredictos da maioria que parecem “obviamente corretos”. E, principalmente, desconfiar do quanto pode parecer “natural” e até “necessário” fazer com que o outro sofra porque “nós” estamos certos.
Moral, ética, bondade, maldade
Além disso, se levarmos em conta a existência de uma instância psíquica inconsciente, que constantemente sabota nossas boas intenções (e quanto menos nos conhecemos mais o faz), fica ainda mais difícil estabelecer uma separação objetiva entre bons e maus. Friedrich Nietzsche (1844-1900), por exemplo, propõe pensarmos “para além do bem e do mal”. Escreve: “Pergunte aos escravos ‘quem é o mau’ e eles apontarão o personagem que a moral aristocrática considera ‘bom’, isto é, o poderoso, o dominador”. O filósofo alemão coloca algo fundamental: está sempre em questão a perspectiva de quem julga, suas experiências e seus interesses. Como então lidar com essa multiplicidade de olhares possíveis sobre um mesmo objeto?

Solução
Uma saída talvez seja lançar mão de um recurso bastante simples: a empatia e fazermos o exercício (nem sempre cômodo ou fácil) de nos colocarmos no lugar do outro, procurando compreender seu ponto de vista – e sua dor. Buscando esse ponto que nos coloca em contato com o outro, tão diferente e ao mesmo tempo tão próximo, talvez seja mais fácil buscar em nós mesmos espaços psíquicos que comportem escolhas menos nocivas. (Da redação)
Podemos te ajudar
O mundo está muito violento, e a mídia divulga de forma acintosa a violência. Com isso, nós nos sentimos inseguros e acuados, razāo pela qual acabamos por julgar pessoas e situações.
A sociedade está cansada de justificativas e busca apoiar iniciativas concretas que visem contribuir para a mudança dessa realidade tão dura. Mas o que de fato estamos fazendo, nesse contexto, para colaborar com a reversão deste quadro social?
Quando procuramos conhecer e entender um pouco mais sobre o comportamento humano, conseguimos nos relacionar melhor com as pessoas, desenvolvemos empatia e podemos contribuir positivamente com o grupo no qual estamos inseridos.
A matéria acima valida o pensamento e as ações da CMK. Temos por verdade que o meio influencia o comportamento das pessoas, até mesmo pela necessidade humana de aceitação. Aqui cultivamos valores éticos e morais, disciplina, foco, elevação da autoestima, hierarquia, respeito, autorrespeito e valorização do ser, no intuito de criar uma maior “fluência psíquica, uma espécie de homogeneidade mental”, a fim de que a identificação entre os membros da família CMK seja feita com a melhor parte que cada um tem.
A proposta da CMK é aliar ciência e espiritualidade em favor do seu bem estar!
OSS!
Fonte: Revista Mente e Cérebro N° 309